ESTUDO DO SONO NA CRIANÇA COM DIFICULDADE ESCOLAR.
Nestes milhares de anos de evolução animal, muitos parâmetros fisiológicos necessitavam ser repetidos com uma determinada freqüência para que o organismo pudesse sobreviver. A produção de alguns hormônios, a retirada de substâncias indesejáveis do cérebro, o descanso muscular (tanto do coração como dos demais) são exemplos disso. Esse ritmo foi denominado circadiano (cerca + dia ou que dura um dia). Dos movimentos de rotação e translação da terra derivam o padrão dia e noite.
Não se conhece nenhum sistema sensorial, em qualquer animal, que tenha a capacidade de captar a rotação da terra. Portanto esta informação é captada principalmente através da visão que é sensível a duração do dia ou da noite ou o nascer e pôr do Sol.
Para a sobrevivência da espécie estes parâmetros passaram de geração em geração através do DNA. Em algum lugar no DNA há o gene do sono, da produção hormonal circadiana, do metabolismo energético, da cognição, da maturação neural...
Desta forma a organização temporal de um indivíduo se expressa de duas formas: como reação a estímulos ambientais (a visão no caso do vidente) associada a ritmicidade intrínseca existente no gene do DNA.
Graças a ritmicidade intrínseca existente no gene do DNA um indivíduo cego de nascença tem a maioria das necessidades relacionadas ao ritmo circadiano preservadas.
A retina é a única estrutura fotossensível do nosso corpo. As informações enviadas por ela através do nervo óptico alcançam estruturas intra-cerebrais que irão estimular os núcleos supraquiasmáticos.
A informação circadiana processada no núcleo supraquiasmático é transmitida por uma rede de conexões que permitem a regulação temporal fisiológica do comportamento, da termorregulação e do sono, além do controle da secreção hormonal diária.
Sabe-se hoje que a estimulação de áreas do hipotálamo posterior induz o alerta. Do hipotálamo anterior (além de outras áreas) induz o sono.
A indução do sono parece ser devida a estimulação de neurônios que inibem a liberação de do neurotransmissor GABA, lentificando a atividade cerebral produzindo um padrão no eletroencefalograma de ondas lentas e de baixa voltagem.
No passado imaginava-se que o sono era um processo uniforme: deitar dormir-acordar levantar. Da observação constatamos que em alguns momentos durante o sono os olhos ficam quase parados. Em outros momentos movem-se com extrema rapidez. Estes momentos que os olhos se movimentam rapidamente foram denominados momentos REM (Rapid Eye Movements). As fases do sono foram então subdivididas em fases REM e não REM.
No exame do eletroencefalograma dois aspectos (entre outros) têm importância: a freqüência e a amplitude da onda.
O estudo eletroencefalográfico do sono mostrou que o sono não REM é composto por três fases denominadas N1, N2, N3 onde a amplitude e a freqüência tornam-se progressivamente mais baixas até que na fase N3 o sono é profundo com desaceleração dos ritmos cardíacos e respiratórios, redução na pressão sanguínea, relaxamento muscular intenso. Na seqüência surge o sono REM caracterizado por ondas de baixa amplitude, alta freqüência movimento rápido do olhar, relaxamento profundo de todos os músculos exceto do diafragma – que promove a respiração, cardíaco e dos olhos.
Este conjunto de padrões não REM (N1, N2 e N3) e REM é denominado ciclo que dura entre 70 e 110 minutos e é repetido entre 4 e 6 vezes durante a noite. Em uma noite de sono normal os padrões correspondem a:
- Fase 1 (N1) 2 a 5% do total do sono
- Fase 2 (N2) 45 a 50% do total do sono
- Fase 3 (N3) 18 a 25% do total do sono
- Fase REM – 20 a 25% do total do sono
Em relação aos sonhos, de maneira bastante resumida, os relatos de sonhos na fase não REM tendem a ser mais curtos, menos nítidos, com menor conteúdo emocional e mais coerentes do que os relatos de sonhos ocorridos durante o sono REM. Não parece existir diferença qualitativa entre relatos de sono REM e não REM de mesma duração.
Crianças têm o sono REM em abundância e raramente relatam sonhos organizados antes dos 7-9 anos de idade.
A ocorrência de sonhos organizados está correlacionada com o desenvolvimento das habilidades visuoespaciais.
Durante o sono o centro neurológico que controla a quantidade de oxigênio e gás carbônico circulante no sangue controla nossa respiração. Momentos brevíssimos de parada respiratória ou de baixa de oxigênio nos fazem suspirar ou bocejar dormindo. São momentos de apnéia (parada respiratória) e de hipopnéia (baixa de oxigênio).
Apnéia prolongada pode acordar subitamente o indivíduo como se ele estivesse tendo um pesadelo. A criança pode acordar gritando (obs: a criança que sofre de microconvulsão durante o sono também pode acordar gritando).
Crianças com amígdalas grandes e/ou adenóides grandes (secundárias a infecções repetidas de garganta), problemas de coaptação dentária, obesidade mórbidas, asmáticas, em uso de alguns medicamentos podem provocar apnéia ou hipopnéia prolongada com despertar repentino. Casos graves podem sofrer parada cardíaca.
A criança que dorme mal tem sonolência durante o dia e sinais clássicos de desatenção.
Quando perguntamos para os pais se a criança dorme bem na maioria das vezes eles respondem que sim. Alguns raros informam tratamento Psicológico por pânico noturno. Mas, a maioria das vezes nenhum deles foi submetido ao exame de polissonografia.
Este exame é extremamente simples e pode ser feito em qualquer laboratório do sono. Ele exige que a criança, acompanhada de um dos pais ou responsável, durma no laboratório conectada a diversos aparelhos que avaliarão o movimento excessivo das pernas durante o sono, o eletroencefalograma, a taxa de oxigenação do sangue, o ritmo cardíaco.
A maioria dos convênios (ou acordos em Portugal) autoriza a realização deste exame quando justificado por CID F81.
Sampaio,PRS; Lamas,FMG. Estudo do sono na criança com dificuldade escolar. Disponível em http://dislexia.med.br/sonoeescola